segunda-feira, 30 de abril de 2012

Decisão do STJ


Concubinato não é reconhecida como união estável
É possível, no mundo dos fatos, a coexistência de relações com vínculo afetivo e duradouro, e até com objetivo de constituir família, mas isso não confere ao concubinato proteção jurídica no âmbito do Direito de Família. A observação foi feita pelo ministro Luis Felipe Salomão, da 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, ao votar dando provimento a Recurso Especial de uma mulher que buscava restabelecer sentença que negou à amante de seu marido (morto em 2005) o reconhecimento de união estável.
A ação em primeira instância foi impetrada pela concubina, buscando reconhecer a união estável com seu amante, para fins de recebimento de pensão por morte. Em primeira instância, a ação foi julgada improcedente. Segundo o juiz, não foi comprovado que, em algum momento, o homem tenha tentado terminar o casamento para formar uma entidade familiar com ela. A amante, então, apelou, e o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul deu provimento ao recurso. 
Se, mesmo não estando separado de fato da esposa, vivia o homem em união estável com a companheira, deve ser reconhecida a existência de uma entidade familiar paralela ao casamento, com a consequente partilha de bens, justificou o acórdão do tribunal gaúcho.
A mulher "oficial" recorreu, então, ao STJ, sustentando a mesma alegação da sentença de primeira instância: é impossível o reconhecimento de união estável, na medida em que o homem continuou casado e convivendo com ela, não tendo sido demonstrada pela outra parte a separação de fato. Em parecer, o Ministério Público Federal opinou pelo provimento do recurso.
Em decisão unânime, a 4ª Turma do STJ declarou a impossibilidade de reconhecimento da união estável concomitante ao casamento. “Mesmo que determinada relação não eventual reúna as características fáticas de uma união estável, em havendo o óbice, para os casados, da ausência de separação de fato, não há de ser reconhecida a união estável”, afirmou o ministro Luis Felipe Salomão, relator do caso.
O advogado da amante disse que, apesar de formalmente casado com a esposa, o falecido estava separado de fato desde 2000, sendo possível a habilitação da autora da ação junto ao Instituto de Previdência do Estado do Rio Grande do Sul (Ipergs), para o recebimento de pensão relativa ao benefício previdenciário do companheiro. Afirmou também que ele não deixou totalmente a esposa porque ela havia ficado doente, após sofrer um acidente.
O ministro Salomão, porém, observou que a manutenção de uma sociedade conjugal por finalidades outras que não as tradicionalmente imaginadas pela doutrina ou pela sociedade não descaracteriza como casamento a união voluntária entre duas pessoas. “Descabe indagar com que propósito o falecido mantinha sua vida comum com a esposa, se por razões humanitárias ou por qualquer outro motivo, ou se entre eles havia vida íntima”, considerou. 
Na contestação, a defesa da esposa afirmou que ela permaneceu casada com o falecido por 36 anos, até a sua morte em 2005, sem que ele jamais tivesse abandonado o lar. Argumentou que a própria concubina escrevera carta admitindo que ele continuava casado, não podendo ser reconhecida a união estável paralela, mas mero relacionamento extraconjugal.
Ao dar provimento ao recurso especial, o relator ressaltou que tal ingerência agride a garantia de inviolabilidade da vida privada e, de resto, todos os direitos conexos à dignidade da pessoa humana. “Não se mostra conveniente, sob o ponto de vista da segurança jurídica, inviolabilidade da intimidade, vida privada e da dignidade da pessoa humana, abrir as portas para questionamento acerca da quebra da affectio familiae, com vistas ao reconhecimento de uniões estáveis paralelas a casamento válido”, concluiu o ministro. 

domingo, 29 de abril de 2012

Negada Indenização



Dever de fidelidade não abrange cúmplice de traição
“Não há ilicitude na conduta da apelada, uma vez que a mesma não possuía qualquer dever legal ou contratual de zelar pela fidelidade na relação conjugal da apelante com seu ex-marido”. Com esta conclusão, a 1ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo negou o pedido de uma mulher que queria que sua vizinha a indenizasse por danos morais porque se relacionou com seu marido.
A mulher, que foi casada por 30 anos, teve a confirmação por parte do próprio marido de que ele tinha relações sexuais com a vizinha. A mulher tinha desconfiança da traição. Recebeu diversos telefones anônimos que falavam sobre a relação extraconjugal de seu marido. Mas, em vez de processar o marido, resolveu ajuizar ação contra a vizinha. Baseou-se na quebra de suposto dever de sinceridade e lealdade decorrente da amizade existente entre as partes.
Para o relator do caso, desembargador Paulo Eduardo Razuk, não há dúvidas de que, ao descobrir o adultério, a mulher teve sua honra afetada, com prejuízo à sua autoestima — tanto que se separou do marido.
Mas considerou que a indenização não deveria ser paga pela ex-amiga, conforme já havia afirmado o juiz de primeira instancia: “o dever de fidelidade, respeito e consideração mútuos existe apenas entre os cônjuges que se comprometeram em observá-los quando celebraram o contrato de casamento não se estendendo a terceiros que não fazem parte da instituição formada ou do contrato celebrado que, frise-se, é bilateral. Portanto, os deveres jurídicos impostos pelo art. 1566 do CC/02 não alcançam o cúmplice em adultério ocorrido durante a vigência da sociedade conjugal.”
Clique aqui para ler a íntegra da decisão. 
Por Rogério Barbosa

sexta-feira, 27 de abril de 2012

Crítica

Companheiro(a) do debate, eu compartilho a crítica escrita pelo advogado jorge André Irion Jobim:
Mães menininhas

Já não causa admiração ver meninas recém saídas da infância ficarem grávidas precocemente e totalmente despreparadas para a maternidade. Ainda ontem, vi passar na frente de casa mais uma delas, com não mais do que 14 anos, carregando uma barriga que deixava clara a gravidez já adiantada.
Como o tempo passa depressa. Afinal, anteriormente, vi a mãe dessa menina grávida também, e sabem de quem? Isso mesmo. Dela, da menina a que estou me referindo e que, por acaso, ainda bebê de colo, foi minha cliente representada pela mãe e pela avó, na busca de uma pensão alimentícia a ser paga por um pai ainda adolescente e totalmente desprovido de qualquer condição financeira.
Tempos depois, em virtude do pai, então com 18 anos, não ter pago a pensão na data aprazada, elas buscaram a defensoria pública, que ingressou com ação de execução de alimentos e ele, não tendo como pagar, foi parar na prisão. Lá dentro, acabou ficando “escolado” e aprendeu tudo o que era necessário para iniciar uma vida voltada ao crime. Ao sair, o fato de ter estado preso fez com ele “subisse no conceito”, como se diz na gíria dos criminosos. Ele iniciou seu negócio de vender drogas e, em breve, já estava com uma moto e um local bastante frequentado por carros de luxo, fato que acabou chamando a atenção das autoridades. Em uma “batida” no local, o rapaz acabou preso, acusado e condenado por tráfico de drogas. Triste final para algo que começou com um simples amor de adolescentes.
Com pais e mães ainda não preparados para criarem um filho e com avós que precisam se ausentar o dia inteiro para obter o sustento da família, como essas crianças crescem? Que valores dirigem suas vidas? Quais serão suas referências diante do fato notório de que a família que deveria ser para elas um ambiente de proteção integral, não vem mais cumprindo a principal função de lhes dar o aporte afetivo necessário para o seu desenvolvimento saudável, despertando-as para os principais valores éticos e de conduta socialmente aceitos?
Fica evidente que, em sua maioria, os modelos que elas seguirão serão os ditados pelas ruas, pela falsa malandragem, pela pequenez de objetivos e de perspectivas e, em breve, elas continuarão dando sequência ao ciclo iniciado pelas suas gerações anteriores. Muitas dessas meninas estarão trazendo à vida novas crianças condenadas ao desamparo e os meninos, possivelmente, acabarão frequentando a “universidade do crime”, que é a prisão. É um círculo vicioso que, se não for cortado imediatamente por alguma iniciativa conjunta das famílias, da sociedade e dos governos, seguirá assolando e comprometendo inexoravelmente boa parte das novas gerações.

Por Jorge André Irion Jobim, escritor e advogado.


Furto de mamadeiras


Sexta Turma aplica princípio da insignificância a reincidente que tentou furtar mamadeiras 

A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) absolveu uma mulher que havia sido condenada a oito meses e 20 dias de reclusão em regime fechado, por tentar furtar de um supermercado artigos para cuidados de criança. Os ministros consideraram o fato atípico, por ser minimamente ofensivo.

A mulher, reincidente, havia tentado furtar uma chupeta com prendedor, duas mamadeiras, um condicionador e dois kits de xampu e condicionador para criança. Os produtos foram avaliados em R$ 78,93. Antes de conseguir levar os itens, ela foi detida por seguranças.

O ministro Og Fernandes, relator do habeas corpus impetrado em favor da condenada, afirmou que, no caso, “não há como deixar de reconhecer a mínima ofensividade do comportamento”, e votou pela absolvição da mulher.

Antecedentes e reincidência
O relator ressaltou que a existência de maus antecedentes, reincidência ou ações penais em curso não impede a aplicação do princípio da insignificância – entendimento este consolidado pela jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) e do STJ.

A Sexta Turma, de forma unânime, aplicou o princípio da insignificância e concedeu a ordem de habeas corpus. Porém, o ministro Sebastião Reis Júnior ressalvou o seu ponto de vista. Para ele, a reincidência impediria o reconhecimento da insignificância. 

Fonte:  http://www.stj.jus.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=105257

segunda-feira, 23 de abril de 2012

Vínculo afetivo


Juíza garante dupla paternidade em certidão de nascimento

A Justiça de Rondônia garantiu a uma criança o registro em certidão de nascimento, de dupla filiação paterna (biológica e socioafetiva). No caso, a criança reconhece os dois homens como pais e deles recebe, concomitantemente, assistência emocional e alimentar.

De acordo com os autos, o homem que registrou a criança o fez sabendo que ela não era sua filha. Anos depois, a criança descobriu sua ascendência biológica e passou a ter contato com o pai, mantendo, contudo, o mesmo vínculo afetivo e "estado de posse de filha" com o pai afetivo. A situação foi demonstrada em investigação social e psicológica realizada pela equipe multiprofissional.

Como a criança declara expressamente que reconhece e possui os dois pais, a promotora de Justiça Priscila Matzenbacher Tibes Machado se manifestou contrária ao deferimento da exclusão de paternidade, requerendo a manutenção do pai atual e a inclusão do biológico.

Para a juíza Deisy Cristhian Lorena de Oliveira Ferraz, ficou evidente que a pretensão da declaração de inexistência do vínculo parental entre a criança e o pai afetivo partiu de sua mãe, que na tentativa de corrigir "erros do passado", pretendia ver reconhecida a verdade biológica, sem se atentar para o melhor interesse da própria filha. 

Ela destacou ainda que o pai afetivo não manifestou interesse em negar a paternidade, tanto que em contato com a criança disse que, mesmo sem ausência de vínculo de sangue, a considera sua filha. Com informações da Assessoria de Imprensa do MP-RO.


FONTE: Revista Consultor Jurídico, 28 de março de 2012.

domingo, 22 de abril de 2012

Sobre fetos anencéfalos

O direito de não ser um útero à disposição da sociedade
Na última quinta-feira (12/4), o Supremo Tribunal Federal fez mais do que permitir a interrupção da gravidez de fetos anencéfalos. A corte deu o primeiro passo no sentido de reconhecer que as mulheres são donas de seus direitos reprodutivos. Nas palavras do advogado Luís Roberto Barroso, que representou a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Saúde, autora da ação, “o direito de não ser um útero à disposição da sociedade, mas de ser uma pessoa plena, com liberdade de ser, pensar e escolher”.

A plenitude dos direitos reprodutivos da mulher perpassou os votos de diversos ministros, no mesmo sentido dos argumentos de Barroso. Em seus 15 minutos de sustentação oral na tribuna do Supremo, o advogado fundou seus argumentos em quatro pontos: 1 – Interrupção de gravidez de feto anencéfalo não é aborto; 2 – Se considerada aborto, a hipótese é colhida pelas exceções que permitem o aborto no Código Penal; 3 – O princípio da dignidade da pessoa humana impede a incidência do Código Penal no caso e; 4 – Viola os direitos fundamentais reprodutivos da mulher obrigá-la a manter a gestação de um feto que não é viável fora do útero.

Os fundamentos guiaram a decisão, tomada por oito votos a dois, de considerar que a interrupção da gestação em casos de anencefalia do feto não é crime. Da tribuna, Barroso tingiu de cores fortes, principalmente, o fundamento da dignidade da mulher.

“Viola a dignidade da pessoa humana o Estado obrigar uma mulher a passar por todas as transformações físicas e psicológicas pelas quais passa uma gestante, só que nesse caso ela estará se preparando para o filho que não vai chegar. O parto para ela não será uma celebração da vida, mas um ritual de morte. Essa mulher não sairá da maternidade com um berço, mas com um pequeno caixão. E terá de tomar remédios para secar o leite que produziu para ninguém”, afirmou.

De acordo com o advogado, levar ou não a gestação adiante tem de ser uma escolha da mulher: “Esta é a sua tragédia pessoal, a sua dor. Cada pessoa, nessa vida, deve poder decidir como lidar com o próprio sofrimento. O Estado não tem o direito de querer tomar essa decisão pela mulher. Viola a dignidade da pessoa humana submetê-la a um sofrimento inútil e indesejado”.

Confira a transcrição da sustentação oral de Barroso:

Excelentíssimo senhor presidente, senhoras ministras, senhores ministros, senhor procurador-geral da República:

Introdução
Ao iniciar esta sustentação, meu primeiro pensamento vai para as mulheres, para a condição feminina, que atravessou muitas gerações em busca de igualdade e de proteção dos seus direitos fundamentais. O direito de não ser propriedade do marido, de educar-se, de votar e ser votada, de ingressar no mercado de trabalho. O direito à liberdade sexual, conquistada derrotando todos os preconceitos. E agora, perante esse tribunal, um capítulo decisivo dos seus direitos reprodutivos. O direito de não ser um útero à disposição da sociedade, mas de ser uma pessoa plena, com liberdade de ser, pensar e escolher. Senhores ministros: desde a noite dos tempos, muitos séculos de opressão feminina nos contemplam nessa manhã.

Meu segundo pensamento vai para as pessoas que por convicção religiosa ou filosófica não concordam com as ideias e teses que vou aqui defender. Toda crença sincera e não violenta merece respeito e consideração. Não passa pela minha cabeça mudar a convicção de ninguém. A verdade não tem dono. O pluralismo e a tolerância fazem parte da beleza da vida, da vida boa, da vida ética, da vida que inclui o outro. Aqui se trava um debate entre valores e ideias. Cada um em busca do argumento que possa conquistar maior adesão social. A única coisa ruim em um debate de valores e de ideias é um dos lados poder utilizar, em seu favor, o poder coercitivo do Estado. É um dos lados poder criminalizar o ponto de vista diferente. Essa seria uma visão autoritária e intolerante da vida.

O papel do Estado e do Poder Judiciário, nas questões que envolvem desacordos morais razoáveis, não é o de escolher um lado, mas o de permitir que cada um viva a sua crença, a sua autonomia, o seu ideal de vida boa.

Fundamentos da ação
A anencefalia é uma má formação congênita que gera como consequência um feto sem cérebro. O diagnóstico dessa anomalia é feito a partir da décima semana de gestação. Como foi comprovado em audiência pública realizada aqui no Supremo Tribunal Federal, o diagnóstico de anencefalia é 100% seguro e ela é letal em 100% dos casos. Esse feto não terá vida extra-uterina.

O pedido nesta ação é que o STF reconheça o direito de a mulher interromper a gestação neste caso, se esta for a sua vontade, independentemente de autorização judicial. Pede-se a interpretação conforme a Constituição dos artigos do Código Penal que criminalizam o aborto para se declarar que eles não incidem nessa hipótese. Diversos fundamentos sustentam essa pretensão.

Primeiro fundamento: A hipótese não é de aborto e o fato é atípico
A interrupção da gestação de um feto anencefálico não é aborto. É um fato atípico, que não recai na esfera de aplicação do Código Penal. Isso porque o aborto, tal como regido pelo Código, pressupõe a potencialidade de vida extra-uterina do feto. E o feto anencefálico não viverá fora do útero materno, ele não tem essa potencialidade de vida.

No Direito brasileiro não existe uma definição para o momento do início da vida. Mas existe uma definição para o momento em que ocorre a morte: é quando o cérebro para de funcionar. Está na Lei de Transplante de Órgãos. Morte é a morte encefálica, a morte cerebral.

Pois bem: o feto anencefálico não chega sequer a ter início de vida cerebral. Não há sensibilidade, dor ou qualquer rudimento de consciência. Mesmo quem tenha uma posição de absoluta inaceitação do aborto pode apoiar a interrupção da gestação nessa hipótese, porque ela não caracteriza aborto.

Segundo fundamento: Interpretação evolutiva do Código Penal
Ainda que se admita que a hipótese seja de aborto, está-se aqui diante de uma exceção abrigada no sentido e alcance do Código Penal, de modo implícito, mas inequívoco.

O artigo 128 do Código Penal, como se sabe, prevê expressamente duas situações nas quais não se pune o aborto: a) quando necessário para salvar a vida da gestante; e b) se a gravidez resulta de estupro. Em ambas as hipóteses, o feto tem potencialidade de vida, mas admite-se o aborto. No primeiro caso, ponderando-se a vida do feto com a vida da mãe. No segundo, ponderando-se a vida do feto com a violência física e moral sofrida pela gestante.

No caso da anencefalia, não há vida potencial do feto fora do útero materno. Logo, a interrupção da gestação nessa hipótese é menos gravosa do que nas exceções previstas no Código Penal. Esta possibilidade só não constou expressamente do Código Penal porque ao tempo de sua elaboração, em 1940, não havia meios técnicos para o diagnóstico.

Terceiro fundamento: Dignidade da pessoa humana
O princípio da dignidade humana paralisa o Código Penal. Ainda que se admita, mais uma vez, para fins de argumentação, que a interrupção da gestação neste cenário seja uma hipótese de aborto, a incidência das normas do Código Penal que criminalizam tal conduta fica paralisada nesse caso, por força da aplicação do princípio da dignidade da pessoa humana.

Uma das expressões da dignidade humana é o direito à integridade física e psicológica.

Pois bem: viola a dignidade da pessoa humana o Estado obrigar uma mulher a passar por todas as transformações físicas e psicológicas pelas quais passa uma gestante, só que nesse caso ela estará se preparando para o filho que não vai chegar. O parto para ela não será uma celebração da vida, mas um ritual de morte. Essa mulher não sairá da maternidade com um berço, mas com um pequeno caixão. E terá de tomar remédios para secar o leite que produziu para ninguém.

Levar ou não esta gestação a termo tem de ser uma escolha da mulher! Esta é a sua tragédia pessoal, a sua dor. Cada pessoa, nessa vida, deve poder decidir como lidar com o próprio sofrimento. O Estado não tem o direito de querer tomar essa decisão pela mulher. Viola a dignidade da pessoa humana submetê-la a um sofrimento inútil e indesejado.

Quarto fundamento: Viola um conjunto de direitos fundamentais da mulher obrigá-la a manter uma gestação quando ou enquanto o feto não seja viável fora do útero
A criminalização da interrupção da gestação quando o feto não é viável fora do útero viola um conjunto de direitos fundamentais da mulher, assegurados na Constituição, viola os seus direitos reprodutivos. Essa é a posição adotada por todos os países democráticos e desenvolvidos do mundo, que descriminalizaram não apenas a interrupção em caso de anencefalia, mas em qualquer caso, até a décima segunda semana de gestação. Entre eles: Canadá, Estados Unidos, França, Reino Unido, Alemanha, Itália, Holanda, Japão, Rússia, Espanha, Portugal, Dinamarca, Suécia. Praticamente todos os países da Europa. A criminalização antes do ponto da viabilidade fetal, hoje, é um fenômeno do mundo subdesenvolvido (África, países árabes, América Latina). Estamos atrasados. E com pressa.

Para deixar bem claro: ninguém é a favor do aborto! O aborto é sempre um momento traumático na vida de uma mulher. O papel do Estado é prevenir que ele ocorra. No caso da anencefalia, proporcionando uma dieta rica em ácido fólico. Nas situações gerais, pela educação sexual, pela colocação de meios contraceptivos à disposição das pessoas em idade fértil ou amparando as mulheres que desejam ter seus filhos e enfrentam condições adversas. O aborto não é uma coisa boa, embora possa ser necessária ou inevitável. A sua criminalização, em certos casos, viola direitos fundamentais das mulheres. E o caso posto perante este tribunal é um deles.

Obrigar a mulher a manter a gestação que ela não deseja, quando o feto não tem viabilidade fora do útero viola a sua autonomia da vontade, a sua liberdade existencial. Alguém poderia insistir no argumento da potencialidade de vida do feto, independentemente da sobrevida que ele venha a ter. Mas a verdade é que se o feto não tem viabilidade sem o corpo da mãe, e se a mãe não deseja tê-lo, obrigá-la a levar a gestação a termo significa funcionalizá-la, instrumentalizá-la a um projeto de vida que não é o seu. Ela estará sendo tratada como um meio e não como um fim em si, em violação à sua dignidade.

Em segundo lugar, há violação do direito à igualdade. Só as mulheres engravidam. Se os homens engravidassem, a interrupção da gestação — não apenas do feto anencefálico, mas qualquer gestação — já teria sido descriminalizada há muito tempo, como observou, com a sensibilidade costumeira, o ministro Carlos Ayres. Obrigar uma mulher a manter a gestação que não deseja, não sendo o feto viável fora do útero, é discriminá-la em relação aos homens, que não estão sujeitos a essa obrigação. Ou a escolha é da mulher ou não haverá igualdade.

Tudo sem mencionar o dramático problema de saúde pública e a imensa discriminação contra as mulheres pobres. A criminalização é seletiva e o corte é de classe. De acordo com o Ministério da Saúde, dia sim, dia não uma mulher morre de aborto clandestino no país. Todas pobres.

Quem é a favor da vida deve ser contra a criminalização. De acordo com dados da Organização Mundial de Saúde, a criminalização não diminui o número de abortos. Apenas impede que ele seja feito de modo seguro e aumenta o número de mortes de gestantes. Em países como o Brasil, quem é a favor da vida tem que ser contra a criminalização.

Conclusão
Aí estão, à disposição do Tribunal, quatro fundamentos para acolher o pedido. Do mais minimalista ao mais abrangente: não é aborto; a hipótese é colhida pelas exceções do Código Penal; o princípio da dignidade da pessoa humana impede a incidência do Código Penal; viola os direitos fundamentais reprodutivos da mulher obrigá-la a manter a gestação de um feto que não seja viável fora do útero.

Nessa matéria, o processo legislativo, o processo político majoritário, não consegue produzir uma solução. E quando a história emperra, é preciso uma vanguarda iluminista que a faça andar. É este o papel reservado ao Supremo no julgamento de hoje. Qualquer dos fundamentos conduz à procedência do pedido. Mas se este tribunal reconhecer a plenitude dos direitos reprodutivos da mulher, este será um dia para jamais esquecer. O marco zero de uma nova era para a condição feminina no Brasil.

Disponível: Revista Consultor Jurídico, 17 de abril de 2012

Por Rodrigo Haidar

Fonte: http://www.conjur.com.br/2012-abr-17/direito-mulher-nao-utero-disposicao-sociedade


sábado, 21 de abril de 2012

Convite

Prezado(a) companheiro(a) do Debate, 

Através deste espaço, eu repasso o convite para o Curso de Extensão "Educação, Cidadania e Legalidade no Trânsito", a ser realizado na ULBRA, Santa Maria/RS, nos dias 27 e 28 de abril, e nos dias 04 e 05 de maio deste ano.



quinta-feira, 19 de abril de 2012

Texto Publicado

Prezado(a) companheiro(a) do Debate, eu compartilho do texto "Vítimas da Omissão", uma importante crítica acerca do cenário de abandono no qual os nossos jovens estão inseridos:

Vítimas da omissão


O Estatuto da Criança e do Adolescente, no seu artigo 4º, dispõe que é obrigação da família, do Estado e da sociedade promover a proteção integral das crianças e adolescentes. No entanto, tem-se verificado o constante abandono de crianças, desde a primeira idade até a adolescência, por seus pais ou responsáveis. Muitas passam a infância em creches, ou com babás, avós e, por tal razão, os genitores tentam compensar a ausência por meio de compensação pecuniária, presentes e permissividades, a fim de não criarem um ambiente de discórdia entre os filhos, corroborando para a ausência de limites e afeto.

Diversas situações de violência praticadas por adolescentes, de imediato remetem ao julgamento moral e repressivo, com o desejo de punição, sem se perquirir as causas que os levaram a infringir as leis. No entanto, deve-se analisar o contexto da transgressão juvenil. Conforme estudiosos, os jovens repetem as situações vivenciadas, e agir violentamente é um modo de buscar a visibilidade de um ambiente em que eles mesmos são vítimas da brutalidade ou omissão.

Há situações de jovens abandonados afetiva e materialmente pelos familiares, os quais encontram nos grupos de infratores a proteção que necessitam para suprir as carências do abandono e para sobreviver às injustiças sociais. Na realidade, a criança e o adolescente são vítimas da ausência da proteção integral estabelecida pelo ECA e pela Constituição.

Pode-se verificar que uma criação desregrada e/ou a ausência de bons exemplos favorecem a vulnerabilidade dos jovens, colocando em risco o seu devido desenvolvimento sadio, representando uma ameaça social, visto que, com os jovens, o futuro se ensaia. O abandono, a falta de afeto, de limites e de eficácia normativa corroboram para o índice de adolescentes em conflito com a lei.

Os jovens infratores podem ser vítimas de violência construída no próprio ambiente familiar ou social em que estão inseridos. Representam o espelho da omissão do Estado, da sociedade e da família, sendo que esta, dita instituição basilar, encarregada de preparar os filhos para a coletividade, geralmente é omissa e descumpre com as suas obrigações.

A proteção integral da criança e do adolescente compreende o ser humano enquanto ser em formação, zelando pelo mesmo, com a participação de toda a sociedade. Dessa forma, contribui-se para prevenir e combater a violência juvenil, com a promoção da educação e cidadania, proporcionando a formação de pessoas comprometidas com a pacificação social. Chega de omissão!



DENISE SILVA NUNES, LUCAS SACCOL MEYNE, E SILVIA LOPES DA LUZ.
Fonte: http://www.clicrbs.com.br/dsm/rs/impressa/4,41,3730343,19419

Dia Nacional do Índio




Críticas

Chega de altos salários para determinadas categorias, o BRASIL PRECISA DE DISTRIBUIÇÃO DE RENDA!! Pois, de que adianta estar dentre as 6 economias mundias(2012) e ter umas das PIORES DESIGUALDADES SOCIAIS ?????



O magistério, assim como demais segmentos profissionais, merece, sim, receber salário compatível para uma vida digna !!!

quarta-feira, 18 de abril de 2012

Noiva abandonada no dia do casamento

Prezado(a) companheiro(a) do Debate, eu compartilho o julgamento de um processo a seguir, com as informações retiradas do Blog disponível em: http://jobhim.blogspot.com.br/2012/04/danos-morais-e-materiais-noiva.html



DANOS MORAIS E MATERIAIS. NOIVA ABANDONADA NO DIA DO CASAMENTO



Um homem foi condenado a pagar indenização no valor de R$ 9.186,86, por danos morais e materiais, a sua ex-noiva.

Dos fatos
O casal namorou durante dois anos e resolveu se casar. Marcadas as datas do casamento no Cartório de Registro Civil e na igreja, todos os preparativos foram realizados: buffet e lua de mel reservados, vestido de noiva, roupas alugadas para parentes, lembranças e enxoval providenciados.

Porém, no dia designado para a realização do casamento civil, o noivo não apareceu, sem dar qualquer explicação prévia à noiva ou familiares. A autora da ação declarou que não se sentiu somente humilhada, mas prejudicada financeiramente, pois contraiu muitas dívidas com o enlace. O réu alegou que o abandono ocorreu devido à discordância da família da ex-noiva quanto ao local da moradia do casal.

Da decisão
"Inexiste em nossa legislação obrigação do noivo ou da noiva de cumprirem a promessa de casamento, nem ação para exigir a celebração do matrimônio. Contudo, entendo que o rompimento injustificado da promessa no dia do casamento acarreta danos morais e patrimoniais à parte abandonada no altar", explicou a desembargadora Cláudia Pires dos Santos Ferreira, da 6ª Câmara Cível do TJRJ.

Processo Nº 0000813-45.2010.8.19.0075

Fonte: TJRJ

Jorge André Irion Jobim. Advogado de Santa Maria, RS

sábado, 7 de abril de 2012

Preso assassinado na cela

Prezado(a) companheiro(a) do Debate, eu compartilho as informações de um julgamento, retiradas diretamente do Blog http://jobhim.blogspot.com.br/2012/04/responsabilidade-civil-do-estado-preso.html:


SEXTA-FEIRA, 6 DE ABRIL DE 2012

RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. PRESO ASSASSINADO DENTRO DA CELA



O juiz da 1ª Vara da Fazenda Pública Estadual e Autarquias de Belo Horizonte, André Luiz Amorim Siqueira, condenou o Estado de Minas Gerais ao pagamento de indenização de R$ 48 mil por danos morais e mais uma pensão mensal ao menor L.G.N.M, pela morte do pai dele, assassinado dentro de um presídio em que cumpria pena.

O entendimento é de que o Estado tem a séria responsabilidade de guarda de todos os presos, devendo, portanto, responder por qualquer ato praticado.

Dos fatos
L. afirmou que, em 29/04/2005, seu pai, foi encontrado morto, em uma cela na Casa de Detenção Antônio Dutra Ladeira, em Ribeirão das Neves. De acordo com L., a ausência de vigilância sobre os presos, o que permite que eles troquem de cela sem autorização, e a falta de fiscalização durante o banho de sol tornaram possível o assassinato de seu pai dentro do presídio. Segundo o filho, já corria risco de morte.

Do processo
O Estado de Minas Gerais alegou sua ilegitimidade para figurar como réu, argumentando que o assassinato não resultou de conduta de funcionário público, pois foi cometido por companheiros de cela do homem contestou ainda a indenização por danos morais, ponderando que não houve conduta omissiva de qualquer agente do Estado, e o pedido de pensão, pois não constava nos autos que a vítima contribuía para o sustento do filho.

Mas, para o juiz André Siqueira, o Estado tem "a séria responsabilidade de guarda de todos os presos, devendo, portanto, responder por qualquer ato praticado" dentro das penitenciárias. Ele constatou que a morte do pai do menor foi causada pelas agressões de companheiros de cela. Por essas razões, considerou comprovada a responsabilidade civil do Estado e a obrigação de reparar o dano.

Essa decisão é de 1ª instância e está sujeita a recurso.

Processo nº: 0024.10036511-3

Jorge André Irion Jobim. Advogado de Santa Maria, RS